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quarta-feira, 5 de maio de 2010

Estamira e Patrícia

Eu sempre disse que o Brasil possui somente dois problemas, que se fossem sanados nos transformariam numa verdadeira potência: desperdício e impunidade. Se fossem devidamente equacionados e combatidos como causas únicas de todas as nossas mazelas, poderíamos exercer a posição de liderança que tanto gostaríamos e serviríamos de exemplo real a tantos governículos que insistimos em apoiar apesar da visível ignorância e incompetência que os permeia.

O primeiro quadrimestre do ano já arrecadou quatrocentos bilhões de reais segundo o impostômetro instalado na cidade de São Paulo. Sem contar com a arrecadação que será gerada pelo Imposto de Renda. Numa fácil conta de somar, chegaremos ao final do ano com uma arrecadação de um trilhão e duzentos bilhões de reais, sem o IR. Esse larjã vem desde o que é cobrado no pãozinho até a criminosa taxação sobre a produção, que emperra o já sufocado setor pelos juros extorsivos cobrados pelo governo.

Seria de se esperar que vivêssemos em um verdadeiro paraíso, mas o cenário que se descortina diante de nós é dantesco: falência na saúde, na educação, nos transportes com malha viária totalmente sucateada, segurança e sistema carcerário que impera como o pior serviço público prestado a nós, que a tudo assistimos, reclamando em restaurantes bebendo vinho ou na birosca da favela com a indefectível cachaça.

O que desperdiçamos em alimentos nas grandes cidades, se aproveitado, acabaria com a vergonha imoral de seres humanos se alimentando com ratos e urubus pelos lixões das grandes cidades, antes que sejam aterrados e sirvam de alicerce para moradias de madeira pregada que não resistem a uma chuva mais forte. Mas se tornou cultural: nossa produção de restos movimenta uma economia invisível a nossos escrúpulos, eventualmente lembrada em documentários ou reportagens, como "Estamira", do ano 2000.

Estamira vivia no lixão de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias no Rio de Janeiro. Filosofava sobre vida e morte, sobre política e humanismo. E não acreditava em Deus. Como poderia? Achava essa história toda de religião uma baboseira. Sua realidade não permitia elucubrações sobre salvação. Foi internada pelos filhos. Procurem assistir, de preferência de estômago vazio.

Mas o câncer que nos devora e corrói nossa esperança é a impunidade. Ela campeia por todos os setores, em todas as classes sociais, igualando-nos num medonho círculo vicioso, onde a lei é mero adereço e o mais fraco, com o perdão da palavra, sempre se fode. E não entenda por mais fraco o faminto ou o desabrigado, o desempregado ou o doente... não... o mais fraco é aquele que não corrompe nem é corrompido, que é honesto e trabalha, que tem horror a imaginar seu nome sujo ou seu filho cometendo um deslize. Somos nós, que alimentamos essa fera voraz através de nosso dinheiro, administrado por facínoras travestidos de bons moços, preocupados conosco como se fôssemos mais importantes que uma cédula eleitoral.

E, esta semana, uma pérola da impunidade foi gerada. Apesar de todos os indícios, de todas as provas de um inquérito da polícia civil do Rio de Janeiro, o Inquérito Policial Militar absolveu por falta de provas os quatro PMs que mataram e depois desapareceram com o corpo da engenheira Patrícia Amieiro. Eles estão de volta nas ruas, trabalhando normalmente.

Mas nós, cariocas indignados e fartos de tanta sujeira varrida para debaixo dos tapetes dos gabinetes, nunca descansaremos ou pararemos de perguntar: Cadê Patrícia?

3 comentários:

  1. Você, realmente, é um articulista de primeira! Grande texto! Se um dia eu for dona de um jornal ou revista, te contrato na hora!!!!!!!!

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  2. Impressionante !!!
    Não sabia dessa sua qualidade como Escritor. Parabéns e que continue sempre acesa essa sua chama de Escritor Crítico sem vinculações Político-Partidárias, sempre tendo como foco a melhora da vida de um POVO SOFRIDO, HUMILHADO E LUDIBRIADO PELO PODER DE UMA ELITE, que não expressa o desejo mais simples desse POVO.
    Abraços com muito Vento na Veia,
    Pousada da Praia
    Roberto Leal - Diretor Fundador - Vento na Veia

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  3. Meu irmãozão, no momento em que um juiz que vendeu liminares para soltar criminosos é condenado a se aposentar e receber um salário de 25 mil reais (pagos com nosso dinheiro), como é que você pode achar que o judiciário tem moral para julgar alguém?
    Nossas autoridades institucionalizaram a impunidade.

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